RESUMO
Poucos estudos foram desenvolvidos no Brasil sobre a doença hérnia das crucíferas, causada por Plasmodiophora brassicae.
Realizou-se testes de severidade da doença causada por diferentes
populações do patógeno em espécies de brássicas (couve-flor,
couve-chinesa suscetível, couve-chinesa resistente, brócolis e repolho).
As populações de P. brassicae foram obtidas de raízes de
brássicas infectadas originárias de algumas regiões produtoras no
Brasil. Os testes de severidade foram realizados em casa de vegetação
(25±2ºC) mediante inoculações, no colo de cada planta com 2 mL da
suspensão de esporos do patógeno, na concentração de 107 esporos mL-1.
As avaliações ocorreram 35 dias após a inoculação. Em laboratório foi
realizada a extração de DNA dessas populações e análises de PCR-RAPD
para a comparação das características genéticas. As populações obtidas
nas regiões de Carandaí MG e Colombo PR mostraram-se mais agressivas,
manifestando patogenicidade até mesmo em cultivar considerada
resistente. Entretanto, não foi observado um padrão genético específico
quanto ao local de origem das populações avaliadas, sugerindo que mesmo
em locais distantes e com diferenças quanto à severidade, tais
populações são geneticamente semelhantes.
Palavras chaves: hérnia das crucíferas, PCR, patógeno de solo, Brassicaceae.
INTRODUÇÃO
Plasmodiophora brassicae
Woronin é o patógeno responsável pela doença popularmente conhecida
como hérnia das crucíferas (HDC), uma das mais importantes nas regiões
produtoras de brássicas no mundo. Esta doença, característica de regiões
de temperaturas amenas, em torno de ± 20ºC, vem ganhando expressão em
áreas agrícolas tradicionalmente cultivadas com brássicas no Brasil. Uma
vez presente no solo, as estruturas de resistência do patógeno podem
sobreviver por mais de 15 anos (Wallenhammar, 1996), o que dificulta seu
controle.
Em
decorrência da dificuldade de seu isolamento, por se tratar de um
parasita obrigatório, pouco se sabe sobre seu desenvolvimento em
condições brasileiras de cultivo, o que explica a existência de maior
número de trabalhos que avaliam o comportamento de populações de P. brassicae, como os realizados por Ito et al. (1999b) e Murakami et al. (2000) no Japão, quando comparados aos que utilizam isolados monospórico, como o realizado por Manzanares-Dauleux et al.
(2001) na França. Alguns trabalhos relatam a existência de populações
heterogêneas do patógeno em uma mesma área, podendo algumas estruturas
de resistência serem patogênicas e outras não, sendo esta uma das
maiores dificuldades metodológicas com quem trabalha com P. brassicae (Diederichsen et al.,
1996). A forma mais recomendada de controle da HDC é a utilização de
cultivares com maior nível de resistência, pois é considerada a maneira
mais eficiente e econômica. Mas para que essa resistência a doença seja
mantida, é fundamental o entendimento da diversidade do patógeno e os
fatores que interferem na sua agressividade em condições ambientais
brasileiras.
Pouco se sabe sobre a agressividade das populações brasileiras de P. brassicae,
mas alguns trabalhos realizados em outros países trazem algumas
importantes informações, principalmente com relação à observação de
diferenças significativas existentes entre populações heterogêneas, como
as obtidas na Austrália (Crute et al., 1983), Japão (Kuginuki et al., 1999) e Escócia (Jones et al., 1982a), bem como de isolados monospóricos, realizados por Somé et al. (1996) na França e Klever et al. (2001) na Alemanha. Para complementar as informações obtidas a campo sobre P. brassicae,
a utilização de métodos moleculares pode permitir tanto a detecção
precoce do patógeno no hospedeiro ou no solo, bem como a diferenciação
de patótipos. Além disso, pode possibilitar melhor compreensão da
relação entre P. brassicae e diferentes hospedeiros, visando o desenvolvimento de estratégias apropriadas de controle.
Parsons et al. (2003) e Faggian et al. (2003) conseguiram extrair o DNA das estruturas de repouso de P. brassicae
de isolados encontrados em solos australianos, e utilizaram esse DNA
extraído para análises de PCR. Desta maneira, obtiveram uma metodologia
de detecção do patógeno antes do cultivo do hospedeiro. Entretanto, os
autores ressaltam que a técnica não é viável quando existem baixas
concentrações das estruturas de repouso no solo. Ito et al. (1999a) também demonstraram a viabilidade do uso da técnica de PCR para o estudo genético do DNA de P. brassicae, extraído de estruturas de repouso do patógeno encontrados em solos, e de estruturas presentes nos tecidos de hospedeiros (Ito et al.,
1999b). Este trabalho teve como objetivo a avaliação da patogenicidade e
severidade de alguns isolados (populações) brasileiros de P. brassicae,
coletados a campo, bem como a caracterização molecular desses isolados,
na tentativa de se obter maiores informações que possam favorecer o
controle da doença e o desenvolvimento de novas cultivares resistentes.
MATERIAL E MÉTODOS
Isolados de Plasmodiophora brassicae
Raízes de brássicas apresentando sintomas de hérnias, naturalmente infectadas por P. brassicae,
foram coletadas de áreas agrícolas brasileiras e analisadas no
laboratório de Fitopatologia da Faculdade de Ciências Agronômicas,
Departamento de Produção Vegetal/Defesa Fitossanitária, UNESP, Botucatu,
SP, onde foram congeladas em freezer comum antes de serem utilizadas
(Cruz et al., 2009). Destes materiais, onze isolados (populações)
foram selecionados e catalogados conforme local, data de coleta e
hospedeiro.
Teste de Patogenicidade
Dois
ensaios foram conduzidos nos períodos de junho a setembro (ensaio I) e
agosto a outubro (ensaio II) de 2006. Para tanto, os onze isolados foram
multiplicados em mudas de couve-chinesa (Brassica rapa var. pekinensis),
de uma cultivar suscetível ao patógeno (Pak choi), para que suas
estruturas de repouso fossem ativadas após os períodos de armazenamento
em freezer. Mudas de couve-flor (B. oleraceae var. botrytis), cultivar Sharon; brócolis (B. oleracea L. var. italica) cultivar Ramoso Santana; repolho (B. oleracea var. capitata) cultivar Kenzan; couve-chinesa - cultivar suscetível (B. rapa var. pekinensis) Pak choi; couve-chinesa - cultivar resistente (B. rapa var. pekinensis)
Komachi, com quatro semanas de semeadura foram transplantadas para
vasos com capacidade de 1,7L, contendo solo estéril, inoculadas e
irrigadas, quando necessário.
Os ensaios foram mantidos em condições parcialmente controladas de casa
de vegetação (±25ºC), nas dependências do Departamento de Produção
Vegetal/Defesa Fitossanitária da FCA-UNESP, Botucatu (SP), conduzidos em
diferentes períodos: I: 28/07/06 a 01/09/06; II: 25/09/06 a 30/10/06.
Para
a inoculação, 10 gramas de raízes, mostrando sintomas típicos de
hérnias foram trituradas em liquidificador, por um minuto, com 200 mL de
água destilada. Entre as triturações dos diferentes isolados, o copo do
liquidificador foi desmontado e desinfestado por lavagem em água
corrente com detergente comum, depois em solução de álcool a 70%, por 1
minuto, solução de hipoclorito de sódio a 2% por 1 minuto, e finalmente,
enxaguado em água corrente. As suspensões obtidas foram filtradas em
camadas de gaze para a retirada de fragmentos de raízes e a concentração
de inóculo ajustada com o auxílio de hemacitômetro. Em seguida foram
feitas inoculações no colo de cada planta, com 2 mL da suspensão de
esporos de P. brassicae, na concentração de 107 esporos mL-1.
Cada
tratamento contou com seis repetições, onde cada repetição foi composta
de um vaso com uma planta, distribuídas em blocos ao acaso. Passadas
cinco semanas após a inoculação, as raízes foram lavadas e avaliadas.
Para tanto foi utilizada uma escala visual de notas variando de 0 a 4
(0=0%, 1=25%, 2=50%, 3=75% e 4=100%), conforme a porcentagem da área
radicular afetada (Takahashi et al., 2005).
Os dados foram submetidos à análise de variância não paramétrica de
Kruskal-Wallis, para o modelo com dois fatores em blocos completos,
sendo os tratamentos distribuídos de forma casual, quanto ao hospedeiro e
local de origem, complementada com o respectivo teste de comparações
múltiplas (Zar, 1999), obtendo-se dessa maneira a mediana e
semi-amplitude total da severidade da doença causada por P. brassicae,
para cada isolado em diferentes hospedeiros de cada ensaio. Raízes dos
hospedeiros que apresentaram sintomas de hérnias e nota igual ou acima
de 1 (aproximadamente 25% da área radicular afetada) foram considerados
suscetíveis aos isolados testados.
Extração de DNA
O DNA dos isolados de P. brassicae
foi obtido mediante suspensões de esporos, onde 10g de raízes contendo
sintomas de HDC de cada isolado foram trituradas em liquidificador, com
50 mL de água destilada esterilizada por 1 minuto, para que a suspensão
ficasse concentrada. Posteriormente, essa suspensão foi filtrada em dez
camadas de gaze e acondicionada em microtubos com capacidade de 1000µL,
sendo então precipitada por centrifugação a 2.500g, durante 10 minutos, repetindo a operação quatro vezes.
O sobrenadante obtido foi descartado das amostras. Adicionou-se, em seguida, 700 µL da solução I (100mM MgCl2; 200mM Tris-HCl pH 7,4; 30 µg mL-1
DNAse) que foi incubada a 37ºC em "banho maria" por 3 horas, este passo
é imprescindível para eliminação do DNA do hospedeiro, o qual poderia
interferir nas análises. Em seguida, efetuou-se a centrifugação por
2.500g, durante cinco minutos e descartou-se o sobrenadante. Os
precipitados foram então ressuspendidos em 700µL da solução II (5mM
EDTA; 0,5% SDS; 10mM Tris-HCl pH 7,8; 20 µg mL-1 de proteinase K) e incubado a 37ºC, por 30 minutos, e novamente centrifugado por 2.500g durante cinco minutos sendo o sobrenadante novamente descartado (Manzanarez-Daulex et al., 2001).
O
DNA foi extraído de acordo com o protocolo CTAB modificado (Doyle &
Doyle, 1990) adicionando-se 300µL de tampão de extração (2% CTAB; 1,4M
NaCl; 20mM EDTA; 100mM Tris-Cl pH 7,8; 0,2% mercaptoetanol) e incubado
por 30 minutos, a 65ºC. O material obtido foi centrifugado a 1.100g por 1 minuto, e o sobrenadante, transferido para um novo tubo.
O
mesmo volume (300µL) da mistura de clorofórmio e álcool isoamílico (CIA
24:1) foi adicionado e homogeneizado em vortex, em seguida,
centrifugou-se a 1.100g por 2 minutos. A fase superior, aproximadamente
500 µL, foi transferida para novo tubo. O DNA foi precipitado com 2/3 do
volume de isopropanol gelado e mantido no gelo por 30 minutos, então
submetido à centrifugação por 15 minutos, a 1.100g.
O
sobrenadante foi descartado e, ao precipitado, adicionado 1 mL de
álcool 70% sendo centrifugado por 10 minutos a 1.100g. O sobrenadante
foi novamente descartado, e o precipitado permaneceu secando a
temperatura ambiente, por aproximadamente 15 minutos. Depois esse
precipitado foi dissolvido em 20 µL de TE (10mM Tris-HCl; 1mM EDTA) e
20 µg mL-1 de RNAse sendo, em seguida, deixado a 37ºC, por 12 horas.
PCR-RAPD
Para as reações de PCR-RAPD, segundo Manzanares-Dauleux et al. (2001) modificado, o DNA de cada material foi quantificado em espectofotômetro, determinando-se a razão A260/A280
de todas as amostras de DNA para verificar a pureza dos ácidos
nucléicos. A solução estoque de DNA foi diluída em uma concentração
final de 5ng/µL e estocada em freezer a -20ºC, para que o DNA não fosse
degradado, sendo posteriormente descongelada para a realização das
análises de RAPD.
Em
testes preliminares foram selecionados 12 primers arbitrários, obtidos
da Operon Technologies Inc. (Alameda, CA, USA), sendo eles: OPB-10
(CTGCTGGGAC), OPA-2 (TGCCGAGCTG), OPP-7 (GTCCATGCCA), OPP-10
(TCCCGCCTAC), OPA-3 (AGTCAGCCAC), OPG-13 (CTCTCCGCCA), OPA-7
(GAAACGGGTG), OPP-13 (GGAGTGCCTC), OPF-13 (GGCTGCAGAA), OPA-10
(GTGATCGCAG), OPA-13 (CAGCACCCAC) e OPC-16 (CACACTCCAG), que permitiram a
melhor visualização do padrão de fragmentos gerados pela amplificação
de DNA de P. brassicae.
Cada
reação de PCR-RAPD foi composta de 7,5 µL de DNA genômico (1ng/µL) e
22,5 µL de solução mix de reação [(7,45 µL de água ultra pura
esterilizada, 3,0 µL de solução tampão, 2,4 µL de dNTP, 9,2 µL de cada
um dos "primers" descritos acima e 0,45 unidades de Taq polymerase
(Invitrogen, Groningen, Holanda)], totalizando 30 µL em tubos de PCR
com capacidade de 200 µL. O DNA foi substituído pelo mesmo volume de
água ultra pura esterilizada para servir como controle.
A
amplificação foi realizada em termociclador PTC-100 (MJ Research Inc.,
Waterown, MA), programado para iniciar o ciclo de desnaturação a 94ºC
por 30 segundos, seguido de 45 ciclos de 30 segundos a 92ºC, 1 minuto a
35ºC e 2 minutos e 30 segundos a 72ºC, com extensão final de 72ºC por 5
minutos. Os produtos de RAPD foram submetidos a eletroforese em gel de
agarose a 1,5% e TBE 1X , a 4V/cm de gel, onde foram utilizados 10 µL
do material da reação misturados com 5 µL de tampão de carregamento
(0,25 % de azul de bromofenol e 40% de sacarose) (Sambrook et al.,
1987) e 5 µL de marcador 1kb, também misturados com 5 µL de tampão de
carregamento. Posteriormente, as bandas foram visualizadas e
fotografadas sob luz ultravioleta em Eagle Eye II (Stratagene).
Os
dados foram registrados na forma de ausência/presença das bandas no
gel. Bandas de mesmo comprimento foram consideradas como idênticas.
Estes dados foram codificados na forma binária (1 para presença e 0
para ausência). A distância genética entre os isolados de P. brassicae
foi determinada pelo coeficiente de similaridade de Nei & Li
(1979). A matriz de similaridade foi, em seguida, transformada em um
dendrograma não enraizado, utilizando-se o método SAHN Clustering
(Sequential Agglomerative, Hierarchical and Nested) sob procedimento
UPGMA (Unweighted Pair-Group Method with Arithmetic Averaging), no
programa PAUP* (version 4.0b5a) (Swofford, 2002).
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dos
onze isolados analisados, nove foram patogênicos à cultivar de
couve-chinesa suscetível (Pak choi) no ensaio I, realizado no período de
junho a setembro de 2006, e dois isolados não foram patogênicos, os
isolados 3 (Piedade-SP) e 6 (Colombo 2-PR) . No ensaio II todos os isolados foram altamente agressivos para esta cultivar.
Embora o isolado 3 não tenha sido patogênico no ensaio I, no ensaio II
este isolado foi patogênico para couve-flor, couve-chinesa suscetível e
repolho, e o isolado 6, somente para a cultivar de couve-chinesa
suscetível neste mesmo ensaio, o que pode indicar certa preferência
destes isolados para se desenvolverem em períodos que tendem a ser mais
quentes do ano (setembro a outubro).
Os
diferentes resultados podem ser atribuídos ao efeito do ambiente e
adaptação dos isolados às condições climáticas de cultivo ocorridas no
ensaio II (meses de setembro a outubro de 2006), provavelmente devido ao
maior comprimento do dia e intensidade luminosa encontrada nessa época
do ano, quando comparado ao ensaio I. Os fatores ambientais não
controlados na casa de vegetação utilizada podem ter deixado os
hospedeiros mais propensos às infecções para esses isolados. A
severidade de P. brassicae é resultado da interação do genótipo
do hospedeiro com o genótipo do patógeno e as condições de cultivo, onde
plantas altamente suscetíveis que estão em condições de cultivo
adversas, podem ser infectadas por um isolado que não é altamente
agressivo e desenvolverem os sintomas, reforçando o conceito clássico de
doenças.
Em
contraste, um hospedeiro altamente resistente requer um isolado
altamente agressivo e condições de campo ótimas para o desenvolvimento
do patógeno para que ocorra o desenvolvimento da doença. Esta é a
possível explicação para as diferentes reações patogênicas nas duas
épocas de desenvolvimento do ensaio, visto que os hospedeiros
apresentaram menor desenvolvimento da doença no ensaio II, onde o clima
pode ter favorecido o desenvolvimento dos hospedeiros e prejudicado o
dos isolados.
O efeito contrário foi observado no ensaio I, cultivado nos meses de julho a setembro, onde a maioria dos isolados de P. brassicae
foi mais agressiva, pois o patógeno provavelmente foi favorecido pelo
ambiente de cultivo, embora o solo utilizado neste ensaio tenha
apresentado maiores índices médios de matéria orgânica e cálcio que o
solo utilizado no ensaio II, o que poderia ter proporcionado sua
supressividade (Niwa et al., 2007).
Os
isolados 1 (Carandaí-MG), 8 (Colombo 4-PR) e 9 (Colombo 5-PR)
mostraram-se patogênicos para a cultivar de couve-chinesa considerada
resistente (Komachi) nos dois ensaios, mostrando que esses isolados
foram capazes de quebrar a resistência inicial dessa cultivar
independentemente do ambiente de cultivo. Os isolados 5 (Colombo 1-PR) e
7 (Colombo 3-PR) somente foram patogênicos em condições climáticas
encontradas no ensaio I. Isto mostra que não seria prudente a indicação,
da referida cultivar, para o plantio na região de Colombo-PR,
independentemente da época de cultivo, e para a região de Carandaí-MG,
no período de inverno brasileiro, pois pressupõe-se que nestas regiões
de cultivo existam isolados altamente agressivos que podem causar o
desenvolvimento da HDC nessa cultivar de couve-chinesa .
No
ensaio I, mais isolados mostraram-se patogênicos para repolho, como por
exemplo, 1, 2 5, 7, 8 e 9, diferindo dos dados obtidos no ensaio II,
onde apenas os isolados 3 e 11 foram capazes de promover a formação de
hérnias. O mesmo também foi observado para a cultivar utilizada de
brócolis, no ensaio I, onde os isolados 1, 5, 8, 9 e 10 provocaram a
formação de hérnias. Já no ensaio II, apenas o isolado 9 mostrou-se
patogênico a brócolis, indicando ser altamente suscetível a esse
isolado (Colombo 5-PR). Portanto esta cultivar de brócolis (Ramoso
Santana) não deve ser recomendada para o cultivo na região de
Colombo-PR. Os resultados mostram que de maneira geral, os isolados de
Carandaí-MG e os da região de Colombo-PR apresentaram maior severidade,
dentro dos ensaios desenvolvidos para os diferentes hospedeiros, quando
comparados aos isolados coletados no Estado de São Paulo.
Para
os demais hospedeiros, a patogenicidade dos isolados não foi uniforme,
já que para couve-flor, no ensaio I foram patogênicos os isolados 1, 8 e
9, já no ensaio II, apenas o isolado 3 causou sintomas, que não havia
se mostrado patogênico no ensaio anterior. Estas variações são
compreensíveis, visto que cada população pode apresentar estruturas de
repouso com diferentes graus de severidade, podendo desenvolver a doença
conforme as condições ambientais presentes em determinados momentos
(Williams, 1966).
Algumas
repetições, dentro de cada parcela para determinados isolados com menor
severidade, apresentaram plantas com formação de hérnias nos ensaios I e
II,
indicando que estes isolados podem apresentar potencial de
desenvolvimento da doença, dependendo do ambiente de cultivo utilizado,
como mostram os isolados: 10 para couve-flor; 4 para repolho e os 2 e 7
para brócolis no ensaio I e os isolados 1, 4, 6, 7, 9, 10 e 11 para
couve-flor; 5 e 7 para couve-chinesa Komachi (resistente); 2, 4, 6, 7, 8
e 9 para repolho e os 3, 4, 6 e 7 para brócolis no ensaio II.
Muitos estudos desenvolvidos com P. brassicae
utilizaram linhas de hospedeiros diferenciadores da European Clubroot
Differential (ECD) como referenciais em trabalhos similares a este.
Entretanto, Kuginuki et al. (1999) comparando os hospedeiros da
ECD e os utilizados por Williams (1966) em cultivares japonesas, com
relação a populações de P. brassicae, verificaram que esses
hospedeiros diferenciais (ECD) não classificaram claramente 36
populações japonesas quanto à patogenicidade. Esses autores relatam que
os resultados dependem da pureza genética das cultivares e que o ideal,
para este tipo de estudo, ainda são os materiais oriundos de isolamentos
monospóricos, que apresentam maior homogeneidade genética.
Este
tipo de isolamento, entretanto, pode apresentar baixa porcentagem
infectiva, provavelmente em decorrência da variabilidade genética dos
isolados coletados a campo, como no trabalho desenvolvido por Somé et al. (1996), que obteve aproximadamente 10% das mudas inoculadas monosporicamente com sintomas. Jones et al. (1982b) também se depararam com a mesma problemática, pois apenas três plantas de B. campestris var. pekinensis
cv Granaat (suscetível) apresentaram hérnias quando inoculadas
monosporicamente, considerando-se as 450 inoculadas menos de 1% de
sucesso foi obtido utilizando esta técnica.
Donald et al.
(2006) também observaram a interferência das condições climáticas de
cultivo no desenvolvimento de sintomas em linhas diferenciadoras da ECD
(European Clubroot Differential), infectadas por esporos produzidos
nestes mesmos hospedeiros, na Austrália. As linhas diferenciadoras (ECD)
utilizadas mostraram reações intermediárias de severidade em função das
diferentes condições climáticas (luz, matéria orgânica, temperatura,
pH) encontradas nesse país, que diferem das condições de cultivo
européias. Isto indica a necessidade de uma reformulação das linhas
diferenciadoras ECD, como já relatado por Dixon (2001) e Kuginuki et al. (1999). Recentemente, muitos estudos têm indicado o uso de métodos moleculares para a separação de patótipos de P. brassicae,
na tentativa de oferecer melhores ferramentas para o desenvolvimento de
cultivares de brássicas resistentes a HDC em maior escala.
Hatakayema et al.
(2006) também não utilizaram as plantas diferenciadoras de Williams
(1966) e ECD, por não mostrarem resultados claros quanto à
patogenicidade para isolados japoneses. Mas esses autores conseguiram
fazer um agrupamento conforme o comportamento patogênico, o que também
poderia ser feito para os isolados 2 e 10 deste trabalho, pois
apresentaram características patogênicas semelhantes nos dois ensaios,
para os mesmos hospedeiros, podendo ser considerados pertencentes a um
mesmo grupo, embora tenham sido coletados em locais e em espécies
diferentes de hospedeiros dentro do Estado de São Paulo.
Uma
sugestão para um próximo trabalho seria a repetição dos ensaios nas
mesmas épocas, porém em anos seqüentes. Entretanto, Dixon & Robinson
(1986) também observaram diferenças quanto a patogenicidade de
isolados, em diferentes hospedeiros testados em quatro anos seguidos na
Escócia, mesmo não ocorrendo nenhuma anormalidade climática entre esses
anos. Tal resultado sugere que o mecanismo de formação de hérnias é mais
influenciado pelo metabolismo hormonal do hospedeiro e,
conseqüentemente, pelo desenvolvimento da planta e seu vigor.
Os padrões de fragmentos gerados pela amplificação de DNA de P. brassicae, com os "primers" OPA-02 (TGCCGAGCTG) e OPB-10 (CTGCTGGGAC), mostraram o alto grau de polimorfismo do DNA das populações de P. brassicae, o que era esperado, por não se tratar de isolados homogêneos . Mesmo com estes resultados, obteve-se 81,6% de similaridade entre as populações,
onde observamos a formação de três grupos geneticamente similares,
sendo eles: Grupo 1: isolados 1, 2, 5, 10; Grupo 2: 3 e 7 e Grupo 3: 4,
6, 8, 9 e 11. Esses isolados não apresentaram um padrão genético
específico quanto ao local de origem das populações avaliadas, mostrando
que, mesmo em locais distantes e com diferenças quanto à
patogenicidade, tais populações são geneticamente semelhantes. Os
resultados obtidos nas análises moleculares e de severidade da doença,
para hospedeiros inoculados com diferentes isolados, sugerem que os
isolados 2 e 10 são possivelmente originários de um mesmo patótipo, mas
pertencem a grupos geneticamente diferentes.
Estes
resultados mostram que populações (isolados) coletadas de um mesmo
local, em períodos e hospedeiros diferentes, como os isolados 10 e 11,
são geneticamente diferentes, provavelmente resultante dos cruzamentos
entre os possíveis distintos patótipos existentes dentro de uma mesma
área e população de P. brassicae (Jones et al., 1982b). E
isso nos leva a crer que hospedeiros resistentes, a uma determinada
população de uma região, pode ter sua resistência alterada em regiões de
cultivo próximas, pois cada população é evidentemente variável quanto à
patogenicidade, indicando a necessidade de estudos mais detalhados para
que essa variabilidade patogênica seja contornada e cultivares de
brássicas com maior grau de resistência sejam desenvolvidas.
A
alta variabilidade e não correlação entre os resultados obtidos em casa
de vegetação e os moleculares sugere a realização de estudos futuros
quanto a adaptação de análises moleculares mais refinadas para a análise
de isolados brasileiros, como por exemplo, os desenvolvidos por
Kageyama et al. (2003) que utilizaram a região ITS do DNA de
populações coletadas de solos japoneses, e primers específicos para
estudos similares ao desenvolvido. Faggian et al. (1999) também
utilizaram a região ITS do DNA ribossomal (DNAr) e a técnica de nested
PCR, por se tratar de uma região mais preservada.
Manzanares-Dauleux et al. (2001) também conseguiram, através da análise do DNA de nove populações de Plasmodiophora brassicae
e de trinta e sete isolados monospóricos, com o uso de primers
específicos e PCR - RAPD, diferenciar oito patótipos franceses. Outro
fator que deve ser levado em consideração é a pequena quantidade de DNA
coletado das estruturas de resistência de P. brassicae, que acabam por mascarar os padrões de fragmento de polimorfismo. Cao et al.
(2007), entretanto, relatam que o patógeno pode ser detectado em
tecidos do hospedeiro após 3 dias da inoculação, por meio de PCR, mesmo
não ocorrendo a formação de hérnias antes de 24 dias, mostrando a
viabilidade desta técnica para detecções precoces, e sua utilização em
análises rotineiras de laboratório.
Parsons et al. (2003) descrevem que a técnica de PCR é capaz de detectar estruturas de repouso de P. brassicae
viáveis e não viáveis de solo, mas que, para os não viáveis, a detecção
decai com o passar do tempo de vida destas estruturas, o que também
deve ser levado em consideração, pois somente interessa a detecção de
materiais viáveis, o que ainda não é possível. Esses trabalhos reforçam o
potencial de uso desta técnica, bem como a necessidade de aprimoramento
de trabalhos voltados para a caracterização de possíveis patótipos de P. brassicae
no Brasil, utilizando PCR e espécies de brássicas cultivadas no País,
juntamente com algumas linhas diferenciadoras de ECD, para que
informações mais conclusivas sejam obtidas, visando o controle da
doença.
CRUZ, Juliana C. Sodário
et al
.
Caracterização patogênica e molecular de Plasmodiophora brassicae. Trop. plant pathol.,
Brasília,
v. 33,
n. 6, dez.
2008
.
Disponível em
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1982-56762008000600003&lng=pt&nrm=iso>.
acessos em
28
nov.
2012.
http://dx.doi.org/10.1590/S1982-56762008000600003.
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